Tranquilizantes
Márcio Antonini Bernik
Tranqüilizantes são uma denominação popular para um grupo de substâncias que atuam, “predominantemente, sobre a ansiedade e a tensão nervosa”. Na prática o termo se refere a medicamentos usados para diminuir a ansiedade, os ansiolíticos, ou para dormir, os hipnóticos.
O uso de ansiolíticos e hipnóticos é tão antigo quanto a medicina. Em escritos de todas as antigas culturas encontram-se relatos sobre o uso de substâncias capazes de produzir um certo grau de sedação, estado em que transcorriam rituais religiosos, mágicos ou mesmo alguns procedimentos “médicos”. Destas substâncias e ervas, o álcool sempre o mais comum. Até hoje é o fármaco mais usado nestas situações “sociais”.
A história recente dos ansiolíticos e hipnóticos começou com a síntese do ácido barbitúrico por. A.VON BAYER em 1862. No início do século XX os derivados barbitúricos começaram a ser usados como ansiolíticos e hipnóticos. Mais de 2500 derivados do ácido barbitúrico foram sintetizados, dos quais cerca de 50 introduzidos comercialmente. Até a década de sessenta do século passado, foram extensivamente prescritos. Um exemplo de um medicamento barbitúrico ainda muito usado como anticonvulsivante é o fenobarbital (Gardenal).
Na década de 1950, embora os barbitúricos fossem ainda amplamente utilizados, era reconhecida a sua capacidade de induzir tolerância e de causar dependência com o aparecimento de uma síndrome de abstinência tão intensa quanto à do álcool. Outra preocupação ainda maior era o grande risco de morte por envenenamento (como de fato ocorreu com diversas pessoas famosas como a atriz Marilyn Monroe).
Em 1955 o laboratório Roche sintetizou uma série de compostos que, baseando-se em sua presumida estrutura química, foram julgados inativos e, posteriormente, abandonados. Um destes compostos, o Ro 5-0690 (clordiazepóxido, Librium) foi inadvertidamente enviado para análise quando o laboratório passava por uma limpeza de rotina e suas propriedades farmacológicas sedativas e ansiolíticas foram descritas.
Depois do desenvolvimento dos benzodiazepínicos, como por exemplo, o clordiazepóxido, o diazepam (Valium), o clonazepam (Rivotril) e o lorazepam (Lorax), o uso dos barbitúricos foi esquecido.
Acredita-se que a grande popularidade que os benzodiazepínicos alcançaram entre os membros da classe médica e na população leiga deva-se à sua eficácia como ansiolíticos e hipnóticos, aliada à margem de segurança por eles oferecida. No início dos anos 60 publicaram-se vários relatos de sujeitos, mesmo crianças que sobreviveram à ingestão de doses maciças destes remédios.
Os ansiolíticos benzodiazepínicos atuam aumentando a atividade de um sistema inibidor muito importante para o funcionamento de nosso cérebro, o sistema GABA-érgico. Este nome deriva do neurotransmissor diretamente envolvido, o GABA (abreviação de “gamma-amino-butyryc acid” ou ácido gama-amino-butírico).
A partir da década de oitenta estudaram-se outros ansiolíticos não benzodiazepínicos, como a buspirona (Buspar).
Os benzodiazepínicos, se interrompidos abruptamente, podem causar uma síndrome de abstinência com ansiedade, insônia e, em casos mais graves, de pessoas que usavam doses muito altas por longo tempo, até convulsões. Isto caracteriza uma dependência fisiológica ou “física” ao benzodiazepínico. Entretanto mesmo nestas situações, são raras situações de abuso e este problema não pode ser confundido com uma “síndrome de dependência química”. Mais uma vez, basta interromper o uso lentamente, sob orientação médica.
Márcio Bernik é médico psiquiatra formado pela FMUSP, doutor em Psiquiatria pela FMUSP e Professor Colaborador Médico do Departamento de Psiquiatria da FMUSP. Atualmente coordena o Ambulatório de Ansiedade do IPQ FMUSP.
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